Medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública

Postada em: 23/03/2020

Informe nº. 2 (Trabalhista)
23 de março de 2020
 
Este é o segundo informativo do SILVEIRA ATHIAS, o primeiro trabalhista, no contexto da pandemia relacionada ao coronavírus (COVID-19), visando manter nossos clientes e parceiros esclarecidos sobre as mudanças jurídicas que vêm ocorrendo.
 
Neste, o destaque é a recente MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927, que entrou em vigor em 22/03/2020, data de sua publicação, e dispõe sobre as medidas trabalhistas que poderão ser adotadas pelos empregadores para preservação do emprego e da renda e para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20/03/2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (COVID-19), decretada pelo Ministro de Estado da Saúde, em 03/02/2020, nos termos do disposto na Lei nº 13.979/2020.
 
A MP tem aplicação durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6/2020, e, para fins trabalhistas, constitui hipótese de força maior, nos termos do art. 501 da CLT.
 
1 - DURANTE O ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA:
1.1. O empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício.
1.2. O acordo individual terá preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição.
1.3. Poderão ser adotadas pelos empregadores, dentre outras, as seguintes medidas:
I - o teletrabalho;
II - a antecipação de férias individuais;
III - a concessão de férias coletivas;
IV - o aproveitamento e a antecipação de feriados;
V - o banco de horas;
VI - a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
VII - o direcionamento do trabalhador para qualificação; e
VIII - o diferimento do recolhimento do FGTS.
 
2. DO TELETRABALHO, TRABALHO REMOTO OU OUTRO TIPO DE TRABALHO A DISTÂNCIA:
2.1. Teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância é a prestação de serviços preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias da informação e comunicação que, por sua natureza, não configurem trabalho externo.
2.2. Não há controle de jornada, conforme inciso III do caput do art. 62 da CLT.
2.3. O empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância e determinar o retorno ao regime de trabalho presencial, independentemente da existência de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho.
2.4. A alteração do regime de trabalho será notificada ao empregado com antecedência de, no mínimo, 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico.
2.5. As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado serão previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de 30 dias, contado da data da mudança do regime de trabalho.
2.6. Se o empregado não possuir os equipamentos tecnológicos e a infraestrutura necessária e adequada o empregador poderá fornecer os equipamentos em regime de comodato e pagar por serviços de infraestrutura, que não caracterizarão verba de natureza salarial; ou, na impossibilidade do comodato, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador.
2.7. O tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou coletivo.
2.8. Estagiários e aprendizes podem ser submetidos ao regime de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância.
2.9. Não se aplicam aos trabalhadores em regime de teletrabalho, nos termos da MP, as regulamentações sobre trabalho em teleatendimento e telemarketing, dispostas na Seção II do Capítulo I do Título III da CLT.
 
3. DA ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS:
3.1. O empregador informará ao empregado sobre a antecipação de suas férias com antecedência de, no mínimo, 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do período a ser gozado pelo empregado.
3.2. As férias não poderão ser gozadas em períodos inferiores a 5 dias corridos;
3.3. Poderão ser concedidas férias ainda que o período aquisitivo a elas relativo não tenha transcorrido.
3.4. Períodos futuros de férias poderão ser antecipados, mediante acordo individual escrito.
3.5. Trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do coronavírus (covid-19) serão priorizados para o gozo de férias, individuais ou coletivas.
3.6. O empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas dos profissionais da área de saúde ou daqueles que desempenhem funções essenciais, mediante comunicação formal da decisão ao trabalhador, por escrito ou por meio eletrônico, preferencialmente com antecedência de 48 horas.
3.7. O empregador poderá optar por efetuar o pagamento do adicional de 1/3 de férias após sua concessão, até a data em que é devido o 13º salário.
3.8. O pagamento do abono pecuniário estará sujeito à concordância do empregador, aplicável o mesmo prazo do pagamento do terço de férias.
3.9. O pagamento das férias poderá ser efetuado até o 5º dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias, não aplicável o art. 145 da CLT.
3.10. Na hipótese de dispensa do empregado, o empregador pagará na rescisão os valores ainda não adimplidos relativos às férias.
 
4. DA CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS:
4.1. O empregador poderá, a seu critério, conceder férias coletivas e deverá notificar o conjunto de empregados afetados com antecedência de, no mínimo, 48 horas, não aplicáveis o limite máximo de períodos anuais e o limite mínimo de dias corridos previstos na CLT.
4.2. Ficam dispensadas a comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação aos sindicatos da categoria profissional, de que trata o art. 139 da CLT.
 
5. DO APROVEITAMENTO E DA ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS:
5.1. Os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais e deverão notificar, por escrito ou por meio eletrônico, o conjunto de empregados beneficiados com antecedência de, no mínimo, 48 horas, mediante indicação expressa dos feriados aproveitados.
5.2. Os feriados poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas.
5.3. O aproveitamento de feriados religiosos dependerá de concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito.
 
6. DO BANCO DE HORAS:
6.1. Autorizadas a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas, em favor do empregador ou do empregado, estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual formal, para a compensação no prazo de até 18 meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.
6.2. A compensação de tempo para recuperação do período interrompido poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até 2 horas, que não poderá exceder 10 horas diárias.
6.3. A compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador independentemente de convenção coletiva ou acordo individual ou coletivo.
 
7. DA SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO:
7.1. Suspensa a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais.
7.2. Os exames serão realizados no prazo de 60 dias, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.
7.3. Se o médico coordenador de PCMSO considerar que a prorrogação representa risco para a saúde do empregado, o médico indicará ao empregador a necessidade de sua realização.
7.4. O exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de 180 dias.
7.5. Suspensa a obrigatoriedade de realização de treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados, previstos em NR’s de segurança e saúde no trabalho.
7.6. Os treinamentos serão realizados no prazo de 90 dias, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública.
7.7. Os treinamentos poderão ser realizados na modalidade de ensino a distância e caberá ao empregador observar os conteúdos práticos, de modo a garantir que as atividades sejam executadas com segurança.
7.8. As CIPA’s poderão ser mantidas até o encerramento do estado de calamidade pública e os processos eleitorais em curso poderão ser suspensos.
 
8. DO DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO:
8.1. O contrato de trabalho poderá ser suspenso, pelo prazo de até 4 meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional não presencial oferecido pelo empregador, diretamente ou por meio de entidades responsáveis pela qualificação, com duração equivalente à suspensão contratual.
8.2. A suspensão não dependerá de acordo ou convenção coletiva, poderá ser acordada individualmente com o empregado ou o grupo de empregados e será registrada em CTPS física ou eletrônica.
8.3. O empregador poderá conceder ao empregado ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, durante o período de suspensão contratual, com valor definido livremente entre empregado e empregador, via negociação individual.
8.4. Durante o período de suspensão contratual o empregado fará jus aos benefícios voluntariamente concedidos pelo empregador, que não integrarão o contrato de trabalho.
8.5. Se, na suspensão do contrato, o curso ou programa de qualificação profissional não for ministrado ou o empregado permanecer trabalhando para o empregador, a suspensão ficará descaracterizada e sujeitará o empregador ao pagamento imediato dos salários e dos encargos sociais referentes ao período, às penalidades cabíveis previstas na legislação em vigor, e às sanções previstas em acordo ou convenção coletiva.
8.6. Não haverá concessão de bolsa-qualificação na suspensão de contrato de trabalho para qualificação do trabalhador.
 
9. DO DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO:
9.1. Fica suspensa a exigibilidade do recolhimento do FGTS pelos empregadores, referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente.
9.2. Os empregadores poderão fazer uso da prerrogativa independentemente, do número de empregados, do regime de tributação, da natureza jurídica, do ramo de atividade econômica e da adesão prévia.
9.3. O recolhimento das competências de março, abril e maio de 2020 poderá ser realizado de forma parcelada, sem a incidência da atualização, da multa e dos encargos previstos no art. 22 da Lei nº 8.036/1990.
9.4. O pagamento das obrigações referentes dessas competências será quitado em até 6 parcelas mensais, com vencimento no sétimo dia de cada mês, a partir de julho/2020.
9.5. Para usufruir da prerrogativa, o empregador fica obrigado a declarar as informações, até 20 de junho de 2020, observado que as informações prestadas constituirão declaração e reconhecimento dos créditos delas decorrentes, caracterizarão confissão de débito e constituirão instrumento hábil e suficiente para a cobrança do crédito de FGTS; e os valores não declarados serão considerados em atraso e obrigarão o pagamento integral da multa e dos encargos devidos.
9.6. Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho, o empregador ficará obrigado ao recolhimento dos valores, sem incidência da multa e dos encargos devidos, caso seja efetuado dentro do prazo legal, bem como ao depósito dos valores do mês da rescisão, do imediatamente anterior e da multa rescisória.
9.7. Ainda na hipótese de rescisão, as parcelas vincendas terão sua data de vencimento antecipada para o prazo aplicável aos recolhimentos rescisórios.
9.8. As parcelas inadimplidas estarão sujeitas à multa e aos encargos legais.
9.9. Fica suspensa a contagem do prazo prescricional dos débitos relativos ao FGTS pelo prazo de 120 dias, contado de 22/03/2020.
9.10. O inadimplemento das parcelas ensejará o bloqueio do certificado de regularidade do FGTS.
9.11. Os prazos dos certificados de regularidade emitidos anteriormente à data de entrada em vigor da MP serão prorrogados por 90 dias.
9.12. Os parcelamentos de débito do FGTS em curso que tenham parcelas a vencer nos meses de março, abril e maio não impedirão a emissão de certificado de regularidade.
 
10. OUTRAS DISPOSIÇÕES TRABALHISTAS DA MP:
10.1. Estabelecimentos de Saúde:
10.1.1. É permitido aos estabelecimentos de saúde, mediante acordo individual escrito, mesmo para as atividades insalubres e para a jornada de 12x36, prorrogar a jornada de trabalho, nos termos do art. 61 da CLT, e adotar escalas de horas suplementares entre a 13ª e a 24ª hora do intervalo interjornada, sem que haja penalidade administrativa, garantido o repouso semanal remunerado.
10.1.2. As horas extras decorrentes dessas medidas poderão ser compensadas no prazo de 18 meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública, por meio de banco de horas ou remuneradas como hora extra.
10.2. Prazos processuais de autos de infração de NDFC’s: Durante o período de 180 dias, contado de 22/03/2020, os prazos processuais para apresentação de defesa e recurso de autos de infração trabalhistas e NDFC’s ficam suspensos.
10.3. Doença ocupacional por contaminação pelo coronavírus: Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.
10.4. Prorrogação de normas coletivas de trabalho: Os acordos e as convenções coletivos vencidos ou vincendos, no prazo de 180 dias, contado 22/03/20220, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de 90 dias, após o termo final deste prazo.
10.5. Atuação dos Auditores Fiscais do Trabalho: Durante o período de 180 dias, contado de 22/03/2020, os Auditores Fiscais do Trabalho do Ministério da Economia atuarão de maneira orientadora, exceto quanto às seguintes irregularidades: I - falta de registro de empregado, a partir de denúncias; II - situações de grave e iminente risco, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação; III - ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente; e IV - trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.
10.6. Aplicação da MP: O disposto na MP aplica-se às relações de trabalho regidas pela Lei nº 6.019/1974 (trabalho temporário e terceirização) e pela Lei nº 5.889/1973 (trabalho rural). E, no que couber, às relações regidas pela LC nº 150/2015 (trabalho doméstico), tais como jornada, banco de horas e férias.
10.7. Convalidação de medidas anteriormente adotadas: Consideram-se convalidadas as medidas trabalhistas adotadas por empregadores que não contrariem o disposto na MP, tomadas no período dos 30 dias anteriores à 22/03/2020.
 
11. DA ANTECIPAÇÃO DO PAGAMENTO DO ABONO ANUAL EM 2020:
11.1. No ano de 2020, o pagamento do abono anual ao beneficiário da previdência social que, durante este ano, tenha recebido auxílio-doença, auxílio-acidente ou aposentadoria, pensão por morte ou auxílio-reclusão será efetuado em duas parcelas, excepcionalmente.
11.2. A 1ª parcela corresponderá a 50% do valor do benefício devido no mês de abril e será paga juntamente com os benefícios dessa competência.
11.3. A 2ª parcela corresponderá à diferença entre o valor total do abono anual e o valor da parcela antecipada e será paga juntamente com o benefício da competência maio.
11.4. Na hipótese de cessação programada do benefício prevista antes de 31/12/2020, será pago o valor proporcional do abono anual ao beneficiário.
11.5. Sempre que ocorrer a cessação do benefício antes da data programada, para os benefícios temporários, ou antes de 31/12/2020, para os benefícios permanentes, deverá ser providenciado o encontro de contas entre o valor pago ao beneficiário e o efetivamente devido.
 
12. OUTRAS DISPOSIÇÕES DA MP:
12.1. Certidão de tributos federais e dívida ativa da União (alteração do § 5º do art. 37 da Lei nº 8.212/1991): O prazo de validade da certidão expedida conjuntamente pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional do Ministério da Economia, referente aos tributos federais e à dívida ativa da União por elas administrados, será de até 180 dias, contado data de emissão da certidão, prorrogável, excepcionalmente, em caso de calamidade pública, pelo prazo determinado em ato conjunto dos referidos órgãos.
12.2. Restrição excepcional e temporária de entrada e saída do País e de locomoção interestadual e intermunicipal (alteração dos §§ 6º e 6º-A do art. 3º da Lei nº 13.979/2020): Ato conjunto dos Ministros de Estado da Saúde, da Justiça e Segurança Pública e da Infraestrutura disporá sobre a medida de restrição, que poderá estabelecer delegação de competência para a resolução dos casos nele omissos.

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